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dérive

segunda-feira, março 25th, 2013

O ato de dérive ou “andar a esmo” foi concebido como um exercício para deliberadamente revolucionar o dia-a-dia – uma espécie de vagar sem rumo através das ruas da cidade, um nomadismo visionário urbano que envolve uma abertura para a “cultura como natureza” (se compreendi a ideia corretamente) – que, por sua própria duração, inculcaria nos nômades uma propensão a examinar o maravilhoso; talvez nem sempre em sua forma benigna, mas, esperamos, sempre geradora de insights – seja através da arquitetura, do erótico, da aventura, bebidas & drogas, perigo, inspiração, o que quer que seja – da intensidade de percepções & experiências não mediadas.

O termo paralelo no sufismo seria “jornada para os horizontes distantes”, ou simplesmente “jornada”, um exercício espiritual que combina as energias urbanas & nômades do Islã numa única trajetória, algumas vezes chamada de “Caravana do Verão”. Os dervixes fazem votos de viajar num determinado ritmo, nunca passando de mais do que sete ou quarenta noites numa mesma cidade, aceitando o que quer que aconteça, dirigindo-se para onde quer que os sinais & as coincidências, ou simplesmente os caprichos, os levem, movendo-se de um ponto de poder para outro, conscientes da “geografia sagrada”, do itinerário como significado, da topologia como simbologia.

Aqui outra constelação: Ibn Khaldur, Pé na Estrada (tanto o de Jack Kerouac quanto o de Jack London), a forma do romance picaresco em geral, o barão de Münchhausen, wanderjahr, Marco Polo, meninos numa floresta de verão suburbana, cavaleiros do rei Arthur procurando barulho, veados à caça de meninos, perambular de bar em bar com Melville, Poe, Baudelaire – ou fazer canoagem com Thoreau em Maine… a viagem como a antítese do turismo, espaço em vez de tempo.

– Hakim Bey em “Caos: terrorismo poético e outros crimes exemplares”. Grifos meus.

Novos Baianos, Mano Chao, Sidarta, Hesse, Kerouac, Thoreau, Che Guevara. Dervixes. Malucos de BR. Malandragem, vagabundagem evolutiva. A arte de se perder pra se encontrar, de romper com todos os papeis, de tudo o que se espera socialmente de um indivíduo para se descobrir – ou se criar. Ser quem você quiser, transpor a zona de conforto, aprender a pedir, saber em quem confiar, (re)encontrar essa luz tão preciosa abafada pelas empoeiradas cortinas do cotidiano – a intuição. Na construção de um ritmo próprio as hierarquias se confundem. Descobre-se o que realmente tem valor e que o tempo, sendo uma convenção, não existe. Invente o seu. Se permita, mas tenha olhos de ver e coração de ouvir. Deixe e receba um tanto. Vai, caminhante. É questão de desordem.

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