Viajeros – Haciendo Dedo

Saímos de Encarnación e fomos para Posadas, cidade argentina na fronteira com o Paraguai, com o objetivo de pegar nossa primeira carona. Hora de levantar o dedo – ou “hacer dedo”, como dizem por lá.

Fizemos uma plaquinha – o destino era Santa Fé, no norte argentino. Ficamos nos revezando no acostamento com o braço estendido e o dedo levantado e nada. Até que um senhor que estava passando de bicicleta parou para falar com a gente: “Olha, eu não quero ofender, mas vocês não vão conseguir carona para Santa Fé, muito menos aqui. Peçam carona para Corrientes, que é caminho, e lá vocês tentam ir para Santa Fé. E é melhor vocês irem um pouco mais para a frente, porque aqui vai ser difícil”.

Pegamos nossas mochilas e fomos caminhando, com a língua de fora, até encontrarmos umas lojinhas de beira de estrada. Mudamos nossa placa, ficamos em posição e nada. Depois de um tempo um carro parou, mas não era para dar carona. “Aqui não é bom para pedir carona, vocês vão ficar parados aí até amanhã. Vocês têm que andar umas quinze quadras e parar logo depois da saída da cidade.”

E fomos. O sol já estava quase se pondo quando chegamos lá. Mas não desistimos. Na casa à frente um senhor sentado na varanda admirava o lindo por do sol alaranjado. Na esquina, na entrada para o aeroporto, um rapaz fazia flexões (!). Carros foram chegando e estacionando no outro lado da rua. Não entendi o que estava acontecendo, era uma região bem remota. Depois pude ver que se tratava de uma reunião de amigos atrás do ponto de ônibus na entrada para o aeroporto (!?). A coisa estava ficando surreal. E nada de carona.


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Thiago haciendo dedo ao por do sol

Lá pelas oito horas da noite tivemos visita. Era Sergio, um estudante de música que veio pegar carona também para Corrientes, onde sua família mora. Também era a primeira vez que pedia carona. Ofereceu cigarros, tocou violão e perguntou se tomávamos mate. À nossa afirmativa ele saiu correndo, foi até a festa-atrás-do-ponto-de-ônibus e voltou com sua térmica cheia de água quente. Ficamos tomando chimarrão até ele ir tentar carona mais para a frente. Nós ficamos. E nada.

Já devia ser tarde e estava frio – hora de procurar algum lugar para passar a noite. O Thiago queria acampar, mas eu não achei o lugar que ele sugeriu muito seguro e ele achou o mesmo do lugar que eu indiquei. Fomos dormir no aeroporto – felizmente, porque caiu o maior temporal de madrugada.


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Thiago e Sergio.

Dormimos mal, comemos mal (comida de aeroporto é cara…), mas fomos tentar mais uma vez. Depois de algumas horas na estrada um carro parou. Estávamos os dois em pé, pedindo carona com a mochilona nas costas – uma tentativa deseperada de impressionar, de chamar atenção e gerar compaixão nos motoristas. Parece que deu certo. Quase não acreditamos. Eu fui até o carro e o cara perguntou aonde queríamos ir. “Para Corrientes”, eu respondi. “Então vamos”, disse ele. E desceu do carro para ajudar a guardar a bagagem.

Era uma caminhonete fechada. Hugo era o nome do rapaz. Ele falava português, já tinha viajado oito meses pelo Brasil numa experiência parecida com a nossa. Estava indo visitar seu filho de sete anos. “Se não fosse por ele, eu me mandava para o Brasil”, confessou. Acho que ele se reconheceu em nós.

Eu dormi quase todos os 400 km – estava exausta. Ele foi muito legal, passou seu contato para mandarmos notícia e nos deu de presente um mapa rodoviário da América do Sul. Nos deixou na rodovia em Resistencia, logo depois de Corrientes, já na província do Chaco. A ideia era tentar outra carona rumo a Santa Fé, mas o dia se foi e nada.

Passamos a noite na loja de conveniência de um posto de gasolina e, depois do segundo dia pedindo carona sem sucesso, desistimos. Seguimos o conselho de um policial que tentou nos ajudar a conseguir carona (sim, na Argentina é possível encontrar policiais que fazem a intermediação entre caroneiros e motoristas!) e ficamos em Resistencia mesmo. “Uma cidade bonita, com muita cultura”, disse ele. Nos convenceu.


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Eu pedindo carona – Resistencia, Chaco. Foto de Thiago.

 

Esse texto faz parte do livro Viajeros, que foi publicado em posts nesse blog.

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3 Responses to “Viajeros – Haciendo Dedo”

  1. Mizael Aguiar disse:

    Adorei tudo! Amei tudo que disse sobre a sua viagem. Sou publicitário, escritor e desenhista e sou um cara doido para ir à Argentina vender meus desenhos e escrever um livro sobre o “Fernando” o cachorro famoso da cidade de Resistencia. O livro que escrevi fala de “SARAMPO” o cão mais famoso do Brasil.
    Pois é… a vontade é muita e a coragem pouca mas to tentando fazer com que cresça e quem sabe um dia irei. Parabéns e sucesso a vc e todos seus amigos.
    Mizael Aguiar.
    msn: [email protected]

  2. projetocancion disse:

    Olha, teve um cachorro em Resistência, no camping municipal, que apelidamos de “Negro”. Ele nos seguia pela cidade inteira, e no dia em q fomos embora ele não viu quando entramos no ônibus, e pudemos ver ele nos procurando na rua… foi muito muito triste! Era um belo cachorro e foi um companheiro de alguns dias.

    Vai lá, Mizael, é só ter coragem de dar o primeiro passo, depois as coisas fluem por si só

    =)

    Obrigada pela visita!

  3. Muito bacana a aventura de vcs…é para encorajar…as almas amedrontadas…pelo comodismo. Sou de Palhoça e adoraria conhece-los [email protected]

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