Chove em Curitiba. Após uma madrugada reescrevendo histórias bolivianas e passeando pela Bahia da década de 30 de mãos dadas com Jorge Amado e rodeada por garotos de rua impressionantes e comoventes, dormi sem tomar banho. As poucas gotas ralas de água me desencorajaram de meus hábitos higiênicos. Se ao menos o chuveiro esquentasse, se ao menos os meus calçados não estivessem todos furados (sou uma destruidora de sapatos – eles não resistem um mês às minhas pisadas tortas)… se ao menos não me sentisse tão só nessas noites frias… por que não me basto?
Acordei ao meio dia. Nestas minhas férias forçadas pela falta de pagamento por parte da excelentíssima Secretaria Estadual de Ciência Tecnologia e Ensino Superior (se o Estado não respeita meus direitos, quem respeitará?), brinco com meus horários. Minha mania vampiresca, minha ânsia por leitura e silêncio, meu deleite em ouvir belezas e cantar sozinha em meu quarto sempre me rolaram ladeira abaixo nessa tendência de trocar o sol suave da manhã pela quietude da madrugada. Tenho livros para ler, resenhas a fazer, fotos e vídeos para editar – felizmente minha produtividade não está comprometida pela falta de horário fixo e carteira assinada. Os únicos percalços são meus bolsos vazios, minha conta no negativo, minhas dívidas (até agora, poucas, mas amanhã, sabe-se lá).
Democratização da comunicação, políticas culturais, autodeterminação, latinidade – soy loco por ti América, soy loco por ti de amores. Há muito o que fazer, muito o que crescer, muito o que descobrir, muito pelo que lutar (muito o que aprender para saber pelo quê lutar). A vida é uma encruzilhada de três vias: espiritual – o Deus em tudo e em cada um de nós, as individualidades divinas; astral – a energia vital, mais sutil que a matéria e mais tátil que o espírito; e material – o que vemos claramente, o que tocamos, o que insistimos em assumir como a totalidade do universo, enquanto é tão óbvio que a vida vai muito mais além… E eu aqui, no meio de tudo isso, de sirenes de ambulâncias, o cara louco de cola na esquina dando socos no ar, o vizinho mala, carros, carros e carros – a materialidade asfixiante. O encanto da matéria… a vida também é isso, mas será só? Esquecemos de onde viemos, para onde vamos, afinal, por favor, nos perguntemos, qual o sentido de nossas vidas?
Café e cigarros. Matéria. Chuva e frio. Matéria. Filmes argentinos na cinemateca, mas não ouso sair de casa – já basta ter passado o dia de ontem com os pés encharcados. Matéria. E aqui estou eu, precisando de palavras e teclas para expressar minha subjetividade e reclamar da matéria.
boa Mi!!
realmente, o inverno chegou! e com ele tantos questionamentos ….