Posts Tagged ‘américa latina’

Itinerário Donde Miras – Praias Urbanas

terça-feira, agosto 5th, 2008

Depois de passar pela aldeia guarani Tenonde Porã, na cidade de São Paulo, e pela aldeia Rio Branco, no município de Itanhaém, a Expedición Donde Miras chegou a Santos no dia seis de julho. Após a difícil caminhada de uma aldeia à outra na mata, as caminhadas pelo litoral foram tranqüilas – terreno plano, sol e a deliciosa brisa do mar, sem contar a vista e a possibilidade de andar com os pés na água. O grupo integrou-se cada vez mais, formando a família Donde Miras.


Zinho Trindade e Adriano Soares no sarau em Santos.

Os viajantes ficaram alojados na Oficina Cultural Regional Pagu, localizada na antiga cadeia de Santos, graças à Assaoc – Associação Amigos das Oficinas Culturais do Estado de São Paulo, parceira da expedição. Havia um sarau programado para a noite da chegada, mas devido a atrasos da caminhada o grupo chegou meia hora após o horário estabelecido e o equipamento de produção da prefeitura de Santos já não estava disponível. Mesmo assim os Donde Miras percorreram a praça cantando e iniciaram o sarau. Na volta para o alojamento, uma intervenção no busão surgiu espontaneamente, com os versos de Zinho Trindade e poesias de Adriano Soares e Johnny Mucho.


Mucho na intervenção no busão.


Caminhada Santos – São Vicente.

No dia seguinte a caminhada partiu para São Vicente, a primeira cidade do Brasil. Na terça-feira, dia oito, o grupo foi recebido com teatro local na Vila de São Vicente, centro turístico da cidade. O sarau aconteceu à noite, com a participação de apreciadores e produtores de arte locais, e um debate sobre a realidade cultural da cidade foi suscitado. A falta de incentivo cultural por parte da administração pública foi apontado, porém chegou-se à conclusão que atividades culturais podem e devem ser organizadas pela própria população, mesmo sem apoio do Estado.


Teatro de recepção à expedição em São Vicente.


Donde Miras na Vila de São Vicente.

Após um dia de descanso, a expedição seguiu seu trajeto rumo à Praia Grande. O sarau ocorreu no mesmo dia da chegada no ginásio Rodrigão, onde o grupo estava alojado. Estudantes e professores do EJA – Educação para Jovens e Adultos participaram do sarau, no qual foram exibidos o trailer do filme do primeiro trecho da Expedición Donde Miras, de São Paulo a Curitiba em janeiro deste ano, e o filme Panorama – Arte na Periferia, seguidos de música e poesia.

Após Praia Grande foi a vez de Mongaguá. O grupo foi acolhido no Centro Cultural Raul Cortez, onde realizou-se a oficina de dança contemporânea, ministrada por Cícero Mendes. À noite no sarau, os moradores participaram com poesia e blues, e os Donde Miras contribuíram com mais poesia.


Cícero em sua apresentação no sarau em Mongaguá.


Oficina de dança contemporânea em Mongaguá.


Apresentação de blues no sarau em Mongaguá.

A próxima parada foi em Itanhaém. Alisson da Paz coordenou a aula aberta de literatura em ação e mais um sarau foi promovido. De Itanhaém a expedição partiu para Peruíbe, onde Zinho Trindade desenvolveu uma oficina de ritmo e poesia, seguida por um entusiasmante sarau. O destino seguinte era Barra do Ribeira, onde a Expedición Donde Miras iniciaria mais uma fase de sua caminhada, de contato mais intenso com as pessoas e com a natureza.


Ruína de igreja em Itanhaém.


Alisson em Itanhaém.


Bira ajudando Marivone na caminhada de Itanhaém a Peruíbe.

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Donde Miras – Bicicloteca

domingo, agosto 3rd, 2008


De cidade em cidade arrecadando e doando livros – bicicloteca da Expedición Donde Miras, trecho São Paulo – Cananéia, julho de 2008.

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Donde Miras – Interior?

quinta-feira, julho 31st, 2008


Parelheiros, São Paulo capital.

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Donde Miras – Tenonde Porã

quinta-feira, julho 31st, 2008

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Viajeros – Haciendo Dedo

sábado, julho 26th, 2008

Saímos de Encarnación e fomos para Posadas, cidade argentina na fronteira com o Paraguai, com o objetivo de pegar nossa primeira carona. Hora de levantar o dedo – ou “hacer dedo”, como dizem por lá.

Fizemos uma plaquinha – o destino era Santa Fé, no norte argentino. Ficamos nos revezando no acostamento com o braço estendido e o dedo levantado e nada. Até que um senhor que estava passando de bicicleta parou para falar com a gente: “Olha, eu não quero ofender, mas vocês não vão conseguir carona para Santa Fé, muito menos aqui. Peçam carona para Corrientes, que é caminho, e lá vocês tentam ir para Santa Fé. E é melhor vocês irem um pouco mais para a frente, porque aqui vai ser difícil”.

Pegamos nossas mochilas e fomos caminhando, com a língua de fora, até encontrarmos umas lojinhas de beira de estrada. Mudamos nossa placa, ficamos em posição e nada. Depois de um tempo um carro parou, mas não era para dar carona. “Aqui não é bom para pedir carona, vocês vão ficar parados aí até amanhã. Vocês têm que andar umas quinze quadras e parar logo depois da saída da cidade.”

E fomos. O sol já estava quase se pondo quando chegamos lá. Mas não desistimos. Na casa à frente um senhor sentado na varanda admirava o lindo por do sol alaranjado. Na esquina, na entrada para o aeroporto, um rapaz fazia flexões (!). Carros foram chegando e estacionando no outro lado da rua. Não entendi o que estava acontecendo, era uma região bem remota. Depois pude ver que se tratava de uma reunião de amigos atrás do ponto de ônibus na entrada para o aeroporto (!?). A coisa estava ficando surreal. E nada de carona.


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Thiago haciendo dedo ao por do sol

Lá pelas oito horas da noite tivemos visita. Era Sergio, um estudante de música que veio pegar carona também para Corrientes, onde sua família mora. Também era a primeira vez que pedia carona. Ofereceu cigarros, tocou violão e perguntou se tomávamos mate. À nossa afirmativa ele saiu correndo, foi até a festa-atrás-do-ponto-de-ônibus e voltou com sua térmica cheia de água quente. Ficamos tomando chimarrão até ele ir tentar carona mais para a frente. Nós ficamos. E nada.

Já devia ser tarde e estava frio – hora de procurar algum lugar para passar a noite. O Thiago queria acampar, mas eu não achei o lugar que ele sugeriu muito seguro e ele achou o mesmo do lugar que eu indiquei. Fomos dormir no aeroporto – felizmente, porque caiu o maior temporal de madrugada.


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Thiago e Sergio.

Dormimos mal, comemos mal (comida de aeroporto é cara…), mas fomos tentar mais uma vez. Depois de algumas horas na estrada um carro parou. Estávamos os dois em pé, pedindo carona com a mochilona nas costas – uma tentativa deseperada de impressionar, de chamar atenção e gerar compaixão nos motoristas. Parece que deu certo. Quase não acreditamos. Eu fui até o carro e o cara perguntou aonde queríamos ir. “Para Corrientes”, eu respondi. “Então vamos”, disse ele. E desceu do carro para ajudar a guardar a bagagem.

Era uma caminhonete fechada. Hugo era o nome do rapaz. Ele falava português, já tinha viajado oito meses pelo Brasil numa experiência parecida com a nossa. Estava indo visitar seu filho de sete anos. “Se não fosse por ele, eu me mandava para o Brasil”, confessou. Acho que ele se reconheceu em nós.

Eu dormi quase todos os 400 km – estava exausta. Ele foi muito legal, passou seu contato para mandarmos notícia e nos deu de presente um mapa rodoviário da América do Sul. Nos deixou na rodovia em Resistencia, logo depois de Corrientes, já na província do Chaco. A ideia era tentar outra carona rumo a Santa Fé, mas o dia se foi e nada.

Passamos a noite na loja de conveniência de um posto de gasolina e, depois do segundo dia pedindo carona sem sucesso, desistimos. Seguimos o conselho de um policial que tentou nos ajudar a conseguir carona (sim, na Argentina é possível encontrar policiais que fazem a intermediação entre caroneiros e motoristas!) e ficamos em Resistencia mesmo. “Uma cidade bonita, com muita cultura”, disse ele. Nos convenceu.


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Eu pedindo carona – Resistencia, Chaco. Foto de Thiago.

 

Esse texto faz parte do livro Viajeros, que foi publicado em posts nesse blog.

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Donde Miras – No caminho do trem

terça-feira, julho 22nd, 2008

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Donde Miras – Urucum

quarta-feira, julho 16th, 2008

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Donde Miras – Questão guarani

quarta-feira, julho 16th, 2008

Ao passar por aldeias guaranis, algumas questões inevitavelmente vêm à tona. Eles vivem praticamente isolados, em territórios determinados e protegidos – uma grande prisão para que tenham a possibilidade de conservar sua cultura.

Os guaranis, nativos de grande parte do território brasileiro, foram mortos, escravizados, roubados e hoje vivem de cestas básicas do governo. Com valores completamente diversos daqueles vigentes em nossa sociedade capitalista, foram banidos desse tempo. Vivem à margem da sociedade, atrás de cercas, para que não tomem o pouco que lhes sobrou.

Menino na Aldeia Rio Branco, Itanhaém.

Martim Afonso, o primeiro escravagista do Brasil, é tido como herói e tem seu nome em ruas e instituições públicas. Já os índios mortos foram esquecidos. Pouco sabemos da cultura indígena. No dia do índio as crianças colocam cocares como o fariam com qualquer fantasia de carnaval. A sociedade “branca” nega suas origens.

Os jesuítas também têm seus nomes em ruas e são lembrados como nobres homens que trouxeram a palavra de Deus aos índios selvagens. Padre Anchieta conta com milhares de devotos. Mas que direito o homem branco tinha de trazer sua verdade como A Verdade? Que Deus é esse que priva o homem de sua cultura, de suas crenças, de sua vida? Ouvi uma história de um guarani que virou crente e chorava desesperadamente porque acreditava que todos os seus antepassados estavam no inferno.

Os guaranis nos mostraram sua receptividade, seu sorriso fácil, sua harmonia com a natureza e a capacidade física natural do homem, que o povo da urbes esqueceu sentado no sofá em frente à TV. Também nos mostraram as imensas dificuldades que enfrentam, a pobreza, o alcoolismo e a falta de identidade cultural daqueles que não são nem rurais nem urbanos, no limbo entre sua ancestralidade guarani e a civilização atual. A sociedade enterrou o índio, mas ele está vivo, sufocando. Seus gritos são ouvidos, vindos debaixo da terra. É hora de descavar.

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Donde Miras – Fazendo biju

quarta-feira, julho 16th, 2008

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Viajeros – O país da informalidade

quarta-feira, julho 16th, 2008

Uma característica paraguaia quase sempre esteve presente: a informalidade. Assunção provavelmente concentra o maior índice de vendedores ambulantes por metro quadrado. Chipas – um tipo de broa bem típica do Paraguai -, maçãs, chicletes, óculos escuros, capas de celular, cigarros – ou seja, quase tudo que se possa imaginar sendo vendido nas ruas. E nos ônibus. Os vendedores podem entrar sem pagar passagem, oferecem seus produtos e descem. É muito bom quando se está cansado e com fome e aparece um vendedor com chipas quentinhas, mas as altas taxas de trabalho informal refletem a difícil condição do país, que não é capaz de gerar empregos suficientes para sua população.

O Paraguai é informal também em outro sentido – no jeito de ser do seu povo. Um exemplo: encontramos María Esperanza Ortiz, filha de Demétrio Ortiz, um tradicional músico paraguaio, numa homenagem a seu pai no museu de Ypacaraí. Ao fim da cerimômia ela convidou todos a visitar o museu que mantém em sua casa em Assunção. Conversamos com ela, que nos passou seu endereço e telefone. Disse que estaria nos esperando sábado à tarde e pediu para ligarmos para confirmar a visita. Eu liguei no sábado, como marcado, e Nicolás, seu marido, atendeu: “Ah, é a brasileira? Vocês não querem vir aqui hoje à noite, vai ter música, churrasco…”, falou ele em português, com forte sotaque paraguaio. Obviamente nós aceitamos o convite.


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María, filha de Demétrio Ortiz, e seus convidados.

Pensamos que não passaria de alguns amigos tomando cerveja e cantando à memória de Demétrio Ortiz – o que foi, no final das contas. Mas nos surpreendemos quando percebemos que estávamos num jantar com importantes músicos. Tratava-se do aniversário de trinta anos da morte do homenageado. Inclusive maestros estavam presentes para tocar a música tradicional paraguaia, e em especial, um pouco da obra de Demétrio Ortiz. Os mais velhos talvez lembrem de Mis noches sin ti e Recuerdos de Ypacaraí, as mais regravadas músicas paraguaias. Aliás, o nosso renomadíssimo Caetano Veloso tem uma versão de Recuerdos de Ypacaraí no álbum Fina Estampa.

Demétrio iniciou sua carreira em 1943 no Trio Asunceno, com o qual excursionou pelo Brasil em 1946. No ano seguinte, uma sangrenta guerra civil conturbou o Paraguai. O músico, assim como muitos compatriotas, migrou para Buenos Aires, onde integrou-se a diversos conjuntos, além de dar aulas de dança folclórica na Casa Paraguaia. Faleceu em 1975 na capital argentina, pouco depois de concluir sua autobiografia Una guitarra, un hombre… Demétrio Ortiz.


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Lucio Marín no violão; atrás Nicolás, marido de Maria.

Harpa, violões, maracas e várias vozes. Não sabíamos se tirávamos fotos ou simplesmente apreciávamos a boa música. Tentamos fazer os dois. E mesmo entre artistas renomados fomos muito, muito bem recebidos. O músico Lúcio Marín e sua esposa fizeram questão de passar o telefone e o endereço de sua casa, para que possamos visitá-los da próxima vez que estivermos em Assunção. Ele nos contou (algumas vezes, depois de alguns vinhos) da vez que conheceu Pelé, mas concordou comigo que o melhor jogador da história foi de fato Garrincha. Foi uma noite maravilhosa, que me deixou encantada com a cultura e com o povo paraguaio.

 

Esse texto faz parte do livro Viajeros, que foi publicado em posts nesse blog.

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